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Lucas Porto Marchesini Torres

O professor Lucas Porto Marchesini Torres é o convidado do Espaço do Autor do mês de maio e é o autor do livro Estratégias de uma esquerda armada: militância, assaltos e finanças do PCBR na década de 1980, lançado no coletivo pela EDUFBA em 2017.

Lucas é graduado em História pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), primeiro na Licenciatura em 2009, em seguida reingressando no Bacharelado em 2010. Em 2013 concluiu o Mestrado no Programa de Pós-graduação em História da UFBA, onde desenvolveu uma pesquisa sobre a história das esquerdas no Brasil contemporâneo. Atualmente cursa o Doutorado em história social na Unicamp e é vinculado ao Centro de Pesquisa em História Social da Cultura (CECULT), desenvolvendo pesquisa sobre movimentos sociais na Bahia entre 1945-1964.

Na entrevista, ele comenta sobre seu trabalho, abordando temas que estão em alta como a situação política do Brasil, a ditadura militar, sua opinião a respeito do financiamento das campanhas eleitorais e um pouco a respeito da militância comunista.

1. Conte-nos um pouco sobre suas trajetórias profissional e acadêmica.

Minha formação universitária foi traçada inteiramente aqui na UFBA, da graduação em História, iniciada em 2004, até o mestrado, que concluí em 2013. O mesmo se repete na minha trajetória profissional, já que desde 2008 também sou servidor desta universidade, estando atualmente de licença para cursar o doutorado em São Paulo. Foi uma ótima experiência ter me formado duplamente nesse espaço tão estimulante.

2. Por que estudar o assalto à agência do Banco do Brasil em Salvador?

Foi um tema descoberto por coincidência e amadurecido com o tempo. Estudar o assalto, um evento bastante singular na nossa história recente e com significativa repercussão nacional, nos obriga a ir além do episódio em si e buscar entender o tanto que ele revela à pesquisa histórica. Primeiro, ele não foi único: antes dele aconteceram pelo menos outros dois. Segundo, ele ilustra conflitos da esquerda brasileira nos anos 1980 e diversos elementos de continuidade de uma ditadura que se acreditava superada: vigência da Lei de Segurança Nacional, excessos de uma Justiça Militar, etc. O assalto e os sujeitos que tomaram parte nele são o ponto de partida para entender uma emblemática complexidade social que se manifesta nesse episódio.

3. Qual a importância de um livro sobre esse assunto no contexto político atual?

Meu livro se insere num debate acadêmico bastante intenso sobre as permanências de um longo período da ditadura que experimentamos entre 1964 e 1985 – uma ditadura que foi civil e militar, como é sempre crucial insistir – e esse debate transcende os muros acadêmicos porque alcança a vida cotidiana das pessoas, nos anos 1980 e hoje também. O livro mostra como alguns grupos de esquerda ainda desconfiavam da democracia que ia se reconstruindo e mostra também como o Estado ainda não havia descartado o chamado “entulho autoritário”. Se havia organizações de esquerda que desconfiavam da democracia, havia também trabalhadores acossados por uma Lei de Segurança Nacional e que apostavam cada vez mais na redemocratização plena do país. Isso reforça a ideia de que cada avanço democrático da nossa história recente foi alcançado com esforços coletivos e constantes, numa luta sobretudo por direitos. Com isso eu pretendo relativizar e compreender melhor os limites da redemocratização brasileira, que sem dúvidas ainda precisa avançar. Entender melhor a redemocratização dos anos 1980, bem como o Golpe de 1964, nos permite olhar com outros olhos para o Brasil de hoje.

4. Qual a sua opinião sobre a discussão a respeito do financiamento para campanhas eleitorais?

Esse é um debate que tende a ser muito prolífico porque seu resultado final – espera-se! – poderá diminuir a diferença existente entre o voto do pobre e o voto do rico. E para eles valerem o mesmo é preciso que qualquer candidato disponha da mesma visibilidade social, que suas plataformas sejam amplamente conhecidas e que o elemento financeiro não seja um distintivo na concorrência manifesta nas urnas. Isso só acontece com a isonomia dos recursos financeiros que abastecessem as campanhas. Mas o debate sobre o financiamento das campanhas precisa ser acompanhado pela reafirmação constante da necessidade de respeito ao resultado das urnas, sobretudo depois da controversa interrupção do mandato da presidenta Dilma Rousseff. Não adianta aprimorar o financiamento das campanhas se o resultado das eleições continuar sendo atacado por um golpismo nefasto. Isso vale para toda a conjuntura pré-1964 e para os dias de hoje também.

5. Como você analisa a militância comunista atualmente?

Há algum tempo o termo comunista tinha sumido do cenário político brasileiro e agora ele tem aparecido novamente. Não tanto entre pessoas e partidos que reivindicam sua filiação ao comunismo e muito mais na boca de quem quer ofender ideias e militantes de esquerda e dito por quem entende mais de xingamento do que de História propriamente. A militância de esquerda hoje se desenvolve a partir de padrões um pouco diferentes daqueles das últimas décadas do século XX e talvez o norte da bússola que o comunismo indicava esteja difuso em engajamentos nas questões ambientalistas, étnicas e de gênero, por exemplo. Essas são questões que agora repercutem bastante socialmente e que os princípios comunistas muitas vezes negligenciaram em nome de orientações de classe. Além disso, em escala global, as disputas entre países centrais e periféricos não se define pela dicotomia capitalismo vs. socialismo. Isso reduz a reverberação social do conceito de comunismo, mas não significa que suas pautas de transformação social estejam esquecidas.

 6. Deixe uma mensagem para seus leitores.

Durante todo o processo de escrita do livro minha maior preocupação era de não produzir algo para ficar encalhado nas prateleiras e repositórios da academia. Então eu fugi bastante de uma linguagem hermética do universo acadêmico e também de jargões de uma militância político-partidária, já que o livro trata da história das esquerdas. Evitei longos debates teóricos e não me preocupei em dissecar as filigranas conceituais que distinguiam programaticamente partidos e organizações de esquerda entre as décadas de 1960 e 1980. Este é um livro que tem mais sujeitos do que conceitos! E foi a partir desses sujeitos, homens e também mulheres, que eu me propus a estudar as estratégias de um grupo da esquerda armada brasileira. A ideia era fazer um livro acessível e minimamente aprazível para qualquer leitor e leitora. Espero ter conseguido!

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