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Luciana Xavier

Professora Adjunta do Bacharelado em Planejamento Territorial da Universidade Federal do ABC (São Bernardo do Campo, São Paulo). Doutora em Comunicação Social pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense. Possui graduação em Comunicação Social, Jornalismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2004), e Mestrado em Comunicação pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação e Cultura Contemporâneas da Universidade Federal da Bahia (2008). Realizou estágio doutoral no Spanish & Portuguese Dept. da Tulane University, Nova Orleans, EUA, pelo Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior da CAPES em 2014 e foi pesquisadora visitante na Universidade de Tübingen, Alemanha por ocasião do projeto Literary Cultures of the Global South, com fundos do BMBF/DAAD em 2016. Ganhadora do prêmio Compós 2017 de melhor tese de doutorado. Atua principalmente nas áreas de Estudos Étnico-Raciais, Música Popular, Estudos Culturais, Gênero, Mídia e Comunicação.

EDUFBA: Fale um pouco sobre você e sobre a sua trajetória acadêmico-profissional.

Luciana Xavier: Eu me formei em jornalismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e fiz mestrado no PÓSCOM da Universidade Federal da Bahia. Vivi seis anos em Salvador, trabalhei na TV UFBA com produção jornalística e, na Unijorge, com comunicação e, lá, me iniciei na docência, dando aula por dois anos. Depois, voltei para o Rio de Janeiro, e fiz meu doutorado em comunicação pela Universidade Federal Fluminense, em Niterói, realizando o doutorado sanduíche na Tulane University, em Nova Orleans. Também fui pesquisadora visitante da Universidade de Tübingen, na Alemanha. Em 2016, me tornei professora adjunta da Universidade Federal do ABC, em São Paulo. Desde a graduação, tenho me dedicado à pesquisa da música popular e suas relações com a identidade negra no Brasil, investigando dinâmicas do gênero musical, representações sociais, cenas musicais e também tenho me dedicado às questões de gênero e territorialidades.

 EDUFBA: Qual o contexto de surgimento dos bailes de soul music que você analisa no seu livro? 

Luciana: Os bailes black surgem no Rio de Janeiro dos anos 1970, especialmente nos subúrbios da cidade e em outras áreas periféricas da região metropolitana, em um momento de maior contato com produtos culturais populares massivos, por conta da globalização. Isso em um contexto de barateamento de bens de consumo como discos de vinil, rádios, toca-discos, equipamentos sonoros, televisões, conjuntamente a um maior poder de consumo de classes populares, incluindo uma pequena classe média negra em ascensão, favorecida pelo milagre econômico e pelo maior acesso dessa população ao ensino superior, dentre outros fatores. O consumo cultural, nesse sentido, acompanhou um movimento de afirmação de uma identidade negra e de ações de oposição ao racismo, por meio da autoestima e do estilo, fundamentalmente influenciado pelos movimentos negros norte-americanos e pela cultura de massa afro-americana. Somado a isso, em meio a perseguições por parte da ditadura, e à crítica de setores de uma esquerda mais tradicional, a cena dos bailes soul apresentava uma alternativa política por meio da cultura, da música, do estilo e do entretenimento, que serviu como celeiro para a reorganização de um movimento negro brasileiro mais institucionalizado.

 EDUFBA: Como as pautas identitárias se manifestavam nesses ambientes?

Luciana: A cena musical da Black Rio articulava diversas formas de comunicação e estratégias de ocupação dos territórios da cidade, construindo novas alianças em torno dos significados do que era ser negro naquele momento no Brasil e no mundo. Dos bailes surgiu um novo tipo de estilo, que unia consumo musical a usos diferenciados da dança, da moda, do corpo (criando uma estética “afro”) e da performance. Esse estilo se moldava e articulava diferentes condições de existência e de produção de sentidos, articulando novas estratégias interpretativas das influências culturais globais em nível local. Assim, esses atores demandavam não apenas por visibilidade, mas buscavam uma nova visibilidade, mais positiva e afirmativa, e desafiavam as convenções de raça e cor, subvertendo também os padrões de conduta, não apenas na pista dos bailes, mas na vida diária, incorporando novas maneiras de se vestir, de se comportar, de usar o cabelo, de dançar, desestabilizando fronteiras entre música, consumo, lazer e política.

 EDUFBA: Qual foi a influência deixada pela black music no cenário cultural?

 Luciana: O soul era a trilha sonora da luta contra o sistema racista presente na sociedade norte-americana, e foi incorporado por uma juventude negra brasileira como um instrumento de oposição ao mito da democracia racial brasileira, que mascarava o racismo. Naquele momento de maior conscientização e mobilização entre as populações negras brasileiras, esse gênero musical parecia também mais adequado a um acirramento das discussões em relação ao preconceito racial, mais pertinente do que o samba, já apropriado pelas elites e pelo discurso da identidade nacional. As movimentações em torno do soul também abriram espaço para a configuração de um circuito de entretenimento popular independente, à margem do mainstream musical da época, apontando para novas possibilidades econômicas para produtores, DJs, artistas e consolidando outros segmentos de consumo, especialmente formados por uma juventude negra periférica.

 EDUFBA: Deixe uma mensagem para os seus leitores.

Luciana: Acho fundamental que cada vez mais nos debrucemos sobre a questão étnico-racial e as movimentações das culturas populares na academia brasileira, em especial no campo da comunicação social. Abrir espaço na academia para as dinâmicas culturais periféricas, para as discussões de gênero, para as alteridades subalternas é fundamental. A cultura popular representa um espaço de autodeterminação, de escolhas conscientes, de legitimação identitária, oferecendo uma possibilidade de participação em novas esferas públicas e culturais da sociedade. A compreensão dessas dinâmicas culturais pode, inclusive, acenar para um novo futuro para as relações e políticas étnico-raciais no Brasil, ampliando e redefinindo as ideias a respeito de cidadania.

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