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Regina Gomes

O Espaço do Autor do mês de junho conta com uma conversa com a professora Regina Gomes, autora de "O cinema brasileiro em Portugal", livro lançado no II Festival de Livros e Autores da UFBA, ainda neste mês. Em sua obra, Regina trabalha em dois campos geográficos e culturais diferentes, recepção transnacional e crítica estrangeira de filmes, abordando o cinema brasileiro em Portugal, particularmente na cidade de Lisboa. A autora realiza uma análise dos discursos dos críticos portugueses à luz de alguns conceitos da estética da recepção, da teoria do cinema e da hermenêutica. Regina Gomes é mestre em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia e é doutorou-se em Ciências da Comunicação com especialidade em Cinema pela Universidade Nova de Lisboa, em 2006. É professora do Departamento de Comunicação da UFBA e atua principalmente nas áreas dos Estudos de Crítica e Recepção, Análise Fílmica, Estética do Audiovisual e Retórica da Crítica.  

João Bertonie

1. Conte-nos um pouco sobre sua trajetória profissional e acadêmica. De onde surgiu o seu interesse pela recepção do cinema brasileiro em Portugal? O campo do cinema sempre esteve presente em minha trajetória acadêmica quando, ainda no mestrado, desenvolvi pesquisa sobre a experiência comunicativa nos filmes do cineasta canadense David Cronenberg. Interessava-me pelos estudos sobre recepção no cinema, sobretudo na sua dimensão estética, e o desejo de adentrar por uma investigação de âmbito transnacional resultou em um projeto de doutorado realizado na Universidade Nova de Lisboa do qual este livro nasceu.  Percebi que a acolhida da crítica lusa ao cinema brasileiro não era das melhores naquele momento [entre 2002 e 2006] e com meu espírito de historiadora procurei saber se essa má recepção era recente ou se provinha de década anteriores. Só consegui encontrar as primeiras respostas na análise efetiva dos textos críticos publicados na imprensa de Lisboa.   2. De que forma sua pesquisa ajuda a compreender as lógicas de formação das expectativas em torno de alguns filmes brasileiros em Portugal? Penso que ajudou na medida em que empreendeu uma reflexão que destaca não apenas a configuração histórica do processo, mas também a dimensão estética e retórica dos textos críticos lusos. Sem a abordagem interdisciplinar seria difícil entender a formação desse horizonte de expectativas da crítica que amálgama um horizonte do passado (a legitimação e consagração do Cinema Novo Brasileiro nos anos 60/70) e um outro do presente (a rejeição a esse mesmo cinema por ter escolhido seguir caminhos diversos daquele).   3. A resposta da crítica especializada revela implicações analíticas, estéticas e ideológicas de determinado contexto. Posto isso, o que leva a avaliação lusitana das recentes produções brasileiras ser quase sempre negativa? A pesquisa apontou para a criação de dois paradigmas, transformados em verdadeiras convenções que nortearam a análise da crítica em Portugal: o Cinema Novo e as telenovelas. Estes paradigmas foram motivados por articulações históricas e reforçados por procedimentos retóricos persuasivos que visavam à adesão dos leitores. A partir deles, a crítica lusa cristalizou a ideia de que as obras do cinema brasileiro recente não tinham mais qualidade, ora porque fugiam radicalmente da estética modernista do cinema novo, ora porque se aproximavam das telenovelas globais, consideradas por muitos críticos como subprodutos culturais. Por outras palavras, as obras clássicas do cinema novo, em especial os filmes de Glauber Rocha, demarcaram os parâmetros de avalição da crítica portuguesa sobre todo o cinema brasileiro desde os anos 1960 até, pelo menos, fins da década de 1990. As telenovelas brasileiras, por sua vez, foram lidas pela crítica lusa como produtos da cultura popular de massas criando e reforçando, por consequência, padrões de rejeição ao cinema brasileiro desde fins da década de 1970 quando Gabriela foi exibida por lá.   4. Em seu livro, você levanta a reflexão acerca da crítica como interpretação, para além da retórica. De que maneira esta compreensão da crítica influenciou a sua pesquisa? Além de ter uma função retórica, ou seja, de tentar persuadir o leitor por meio de argumentos, o discurso da crítica exige um lugar de avaliação, de leitura interpretativa do filme. Estava também interessada em pensar sobre as atitudes hermenêuticas dos críticos portugueses, em saber como e porque eles interpretavam o recente cinema brasileiro recorrendo invariavelmente ao modelo do Cinema Novo. Descobri que as interpretações são também construções históricas pautadas em convenções muitas vezes engessadas. O crítico não deve agir como um decodificador do sentido que supostamente estaria congelado no filme e o seu ato é apenas um redutor do “arbitrário” do filme.   5. Deixe uma mensagem para os leitores da Edufba. Fico feliz em saber do comprometimento da Edufba com seus leitores e que a editora vem investindo em um catálogo cada vez mais rico e diversificado, com preços bastante acessíveis. Ao tornar público o conhecimento produzido nas Universidades, a Edufba dá um grande presente aos leitores. Aos leitores digo também que sejam futuros espectadores de filmes brasileiros.

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