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Roberto Santos

No mês de julho, tivemos a oportunidade de realizar o Espaço do Autor com o Prof. Dr. Roberto Santos. Tratamos de assuntos variados, do seu período como estudante na Faculdade de Medicina ao seu mandato como governador da Bahia, da relação com a família à temas da atualidade. Com muita simpatia e simplicidade, nos falou sobre a importância da pesquisa científica para o desenvolvimento do país e as perspectivas que enxerga para a melhoria contínua do ensino e da educação brasileira.

 por Lara Bastos

24/07/2013

 1 – O senhor é graduado em medicina pela Universidade Federal da Bahia, onde também foi professor e reitor. Entre 1975 e 1979 foi governador da Bahia e hoje tem mais de quarenta obras publicadas. Conte-nos um pouco sobre essas experiências. Formei-me em medicina aqui pela Faculdade de Medicina, que mais tarde se tornou da UFBA – quando entrei a Universidade ainda não estava criada. Fiz o curso orientado para a atividade na área de clínica médica. Naquele tempo ainda não havia residência, de modo que, em dezembro de 1949, quando me formei,  tinha a perspectiva de uma bolsa no exterior. Em julho/agosto de 1950 fui para os Estados Unidos, onde a bolsa teve 3 fases. Na primeira fase, em Nova York, fiz um curso de adaptação à medicina americana que durou seis meses. Daí fui para a Universidade de Michigan, onde fiz o que corresponderia hoje à atividade do residente. Com isso aprendi muita medicina, li muito, e de certo modo até refiz uma parte do curso que  havia feito no Brasil, mas com livros e influências diferentes. Após esse período, que durou um ano e meio, fui para o Massachusetts General Hospital – uma unidade da Universidade de Harvard. Lá fui aprender a atividade de pesquisa médica e trabalhei com pesquisadores de grande renome. Em 1953, voltei pra cá e naquela época, todo o currículo do curso de medicina era ainda de influência francesa, embora as coisas já estivessem um pouco superadas. Essa minha bolsa nos Estados Unidos logo se tornou um esforço no sentido de mudar o currículo do curso médico no Brasil. Para isso, fui também preparando os trabalhos de pesquisa que serviriam para galgar os concursos em direção à Cátedra de clínica médica.  Obtive o título de Doutor em Medicina e em seguida fui me preparar para a docência livre, que era um pré-requisito para a inscrição no concurso para a Cátedra. Então, de 53 a 56, a minha atividade foi muito nesse sentido, de preparar essas teses e me preparar para esses concursos. Em 56, já no final do ano, me tornei catedrático de Clínica Médica. Fiquei todo esse tempo, e os anos subseqüentes, trabalhando em tempo integral e dedicação exclusiva. Não abri consultório, apenas passava dias inteiros no Hospital das Clínicas, que naquela época estava recém-inaugurado e em condição de trabalho excelentes. Hoje o mesmo hospital tem o nome do meu pai, é chamado Hospital Universitário Professor Edgard Santos. O convívio com os pacientes de baixa renda me fez perceber que aquele trabalho tão importante, entretanto, atingia um pequeno número da população e que se eu me dedicasse a uma ação política poderia talvez ter alguma participação em providências e medidas que atingissem frações maiores da população. E foi isso que me levou a me interessar pela ação política. Estava nessa atividade (de professor) quando Luís Viana Filho assumiu o governo do Estado e me convidou para ser Secretário de Saúde. Achei que essa era oportunidade que eu estava prevendo de atingir uma parcela maior da população de baixa renda. Acontece que assumi a Secretaria, em 1967, e daí a três meses  fui escolhido Reitor da Universidade. Era novamente uma situação, já na área da educação superior, que me permitia prestar serviços que atingissem parcelas maiores da população. Fiquei na Reitoria de 1967 a 1971, pois naquela época a recondução era proibida. Terminado esse período o Conselho Federal de Educação, do qual fazia parte, me escolheu como Presidente e  me mudei com a família para Brasília. Naquela época Brasília tinha cerca de dez anos de criada. Lá viviam quase exclusivamente os políticos da área federal. Por isso convivi muito com a política partidária e com suas figuras mais destacadas. Até que em 1975 fui eleito Governador do Estado da Bahia pela Assembleia Legislativa. Durante o governo, a minha ênfase maior foi na área da educação, que se considerava prioritária, pela modernização e melhoria da qualidade da educação. Na área da saúde, que era o meu outro ramo de atividade, predominantemente trabalhamos na área preventiva, com a criação de mais de 300 unidades ambulatoriais para cuidar da saúde da família. Além disso, na Bahia só existia um hospital de referência – o Hospital das Clínicas. Um segundo hospital fazia falta, pois o estado havia crescido muito. Por isso construí o hospital que, anos mais tarde, a Assembleia Legislativa viria a dar meu nome. Daí então, como o período do Governo Federal vinha começando a se modificar em maior escala, me filiei a partidos que faziam oposição ao regime militar e entrei de vez para a política. Quando houve a transição para a redemocratização passei a trabalhar junto com Tancredo Neves e fui escolhido para a presidência do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq). Durante pouco mais de um ano presidi o CNPq e depois fui ser Ministro da Saúde. Terminado o período de Ministro, fui representar o Brasil na Organização Mundial de Saúde em Genebra, no Conselho Administrativo desse órgão. Durante três a quatro anos. Terminado esse período me candidatei a deputado federal, já tinha tido uma experiência bastante intensa na área executiva do governo, mas não tinha nenhuma experiência legislativa. Fui eleito Deputado Federal, mas não achei que esta era uma atividade muito do meu temperamento.  sou mais executivo do que legislativo e, ao fim desse período, com uma idade bem avançada, me voltei a atividades mais culturais, que é o que estou fazendo até agora.   2 – Em Vidas Paralelas o senhor faz uma confluência entre a sua trajetória de vida e a de seu pai, Dr. Edgard Santos.  Por que decidiu seguir caminhos tão semelhantes? Foi algo planejado? Foi um interesse próprio aliado ao fato de que a Faculdade de Medicina, entre as várias faculdades que existiam na época, era a que oferecia as melhores oportunidades para o futuro. A Faculdade havia passado por uma fase na qual trabalharam pesquisadores de renome e eu já tinha a aspiração - ou o sonho - de realizar pesquisa científica. Então acho que foi ao mesmo tempo alguma influência de casa e também minha vontade de freqüentar uma faculdade que oferecesse uma melhor oportunidade no campo do estudo e da pesquisa.   3 – No livro Na Bahia das últimas décadas do século XX, o senhor dá a sua versão de alguns fatos importantes deste período. O que o levou a querer publicar essa obra? O primeiro livro (Vidas Paralelas) cobre um período que termina em 1962, que foi o ano da morte do meu pai. Então, nessa comparação das carreiras dele e minha, a lista se interrompeu e eu não tinha mais o que comparar. Aquele era um período em que a divulgação das coisas do governo andava muito discutível, muito duvidosa, nem sempre a realidade do que se tinha passado era o que estava escrito.  Então escrevi este volume para que ficasse declarada minha visão do que estava sendo aquela segunda metade do século XX, período em que fui Reitor, Governador, Ministro de Estado, Presidente do CNPq e representante do Brasil na OMS.   4 – Durante sua gestão como reitor da UFBA (1967-1971), a Universidade passou por uma grande reestruturação. Quais foram as motivações por trás dessas mudanças administrativas e curriculares? Bem, a mudança da estrutura da universidade teve uma influência enorme na qualidade e no volume de pesquisa que se realizava antes dessa época. E, isso não foi só na Bahia, foi no Brasil inteiro. Quando foram criadas as primeiras Universidades no Brasil - a de São Paulo, que era Estadual, e a do Distrito Federal, que na época era no Rio de Janeiro - elas se organizaram pela aglutinação de faculdades que já existiam. Entre os anos de 1934 e os anos de 1967/68, esse foi o padrão de organização das universidades. Mas, entre outros problemas que resultaram desse padrão inicial, estava o de que as disciplinas que tratavam dos setores básicos do conhecimento ficavam fragmentadas em cada faculdade. Se tomarmos a disciplina de Matemática como exemplo, existiam cátedras de Matemática na Escola de Filosofia, na Escola Politécnica, na Faculdade de Arquitetura, na Faculdade de Economia e assim por diante, mas não existia uma Matemática com toda a força de que a Universidade era capaz. A mesma coisa se aplicava a Química, Física, Biologia, Ciências Humanas, Letras, etc. Com isso as universidades prestavam um grande serviço à formação de profissionais de nível superior, mas progrediam pouco na atividade de pesquisa e ainda nem se cogitava ter programas de Pós-Graduação. O fato é: essas disciplinas fragmentadas não criavam massa crítica para que se pudesse fazer pesquisa e naquela altura no Brasil não havia regulamentação para os cursos de Pós-Graduação. Foi por isso que na década de 1960 surgiu uma novidade, com a criação da UnB. Quando foi a hora de se criar uma universidade em Brasília não existiam faculdades mais antigas para serem aglutinadas. Brasília começou então dando ênfase justamente aos setores básicos do conhecimento e à Faculdade de Educação, necessária para a formação de professores que atuariam na região. A ideia que começou lá foi depois aperfeiçoada pelo Conselho Federal de Educação, que propôs que esse modelo fosse regulamentado pelos decretos-lei 53/1966 e 252/1967. Eu assumi a reitoria em 1967, portanto, a minha atividade consistiu predominantemente na adoção desse princípio de dar maior ênfase aos setores de base do conhecimento para se chegar a uma atividade mais proveitosa de pesquisa cientifica e da eventual criação da Pós-Graduação. Procurei reestruturar as unidades universitárias, de modo que existissem departamentos para os setores básicos do conhecimento e outros para as disciplinas profissionalizantes. As disciplinas básicas foram excluídas de cada faculdade para constituir os chamados institutos básicos. Foi quando tomaram corpo os Institutos de Matemática, Química, Física... E por aí a fora. A produção de pesquisa científica aumentou muito no Brasil nos últimos vinte a trinta anos, devido à criação dos cursos de pós-graduação.   5 – Em Desigualdades sociais, educação e ação política o senhor afirma: “Entre os fatores que mantém as grandes desigualdades sociais, no Brasil incluem-se as diferenças nos padrões educacionais das varias regiões do nosso território. As deficiências educacionais das regiões mais pobres figura, a um só tempo, como causa e como consequência dos baixos índices de desenvolvimento econômico e social das populações”. Com o crescimento da economia do nosso Estado e o aumento do número de jovens com acesso à educação superior é possível a reversão dessa situação na região Nordeste? A educação é um investimento que dá frutos a prazos mais longos. Não é possível esperar, mesmo quando há modificações significativas na área de educação, que os resultados fiquem logo evidentes.  Estou certo que, com oportunidades crescentes nessa área, os resultados se tornarão visíveis. Algumas providências tomadas já deram frutos como, por exemplo, a criação do FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério) que possibilitou que o governo federal pudesse financiar a remuneração dos professores das escolas municipais. Esses professores, na sua grande maioria, eram remunerados de forma irrisória, mas com a transferência de recursos federais para os municípios essa remuneração melhorou e isso já está tendo um efeito bem visível, sobretudo nos municípios do interior e das regiões mais pobres. Mas, de modo geral, o que se pode dizer é que a qualidade da educação resulta em reflexos sempre a prazo médio e longo.   6 - Deixe uma mensagem para os leitores da EDUFBA. Durante algum tempo, a produção dos professores não tinha um canal de divulgação. Houve um esforço perpetuado ao longo do tempo que resultou na criação da Editora da UFBA. A Editora vem prestando serviços imensos, não só aos professores quanto aos alunos da Universidade.

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