Pedro Abib
No mês em que se comemora o Dia Nacional do Capoeirista, a Edufba traz no Espaço do Autor, uma entrevista com o cineasta, escritor, professor e capoeirista, Pedro Abib. Abib realizou os filmes Premonição (2011); Fado vadio (2010); Memórias do recôncavo: Besouro e outros capoeiras (2008); Batatinha e o samba oculto da Bahia (2007); Divino Espírito Popular (2006); O Velho capoeirista: Mestre João Pequeno de Pastinha (1999), para o qual ganhou o prêmio Melhor Documentário no Festival de Artes da Unicamp. Autor dos livros Capoeira Angola: cultura popular e o jogo dos saberes na roda e Mestres e capoeiras famosos da Bahia (2ª edição), ambos publicados pela Edufba, Abib conta a sua trajetória e seus futuros projetos, na entrevista a seguir.
Por Camila Fiuza
1- Conte-nos um pouco sobre a sua trajetória acadêmica. Minha formação inicial foi em Educação Física, ainda na década de 1980, na minha cidade, Mogi das Cruzes, estado de São Paulo. Durante algum tempo dei aulas na rede pública de São Paulo até me mudar para Salvador, em 1993. Comecei a dar aulas na Faculdade de Educação nesse mesmo ano, como professor substituto até que fui aprovado em concurso público em 1995 e desde então faço parte do quadro de professores dessa instituição. Em 1997 terminei o mestrado em Educação na UFBA e em 2004 o Doutorado em Ciências Sociais na UNICAMP. Tive a oportunidade ainda de fazer dois Pós-Doutorados: o primeiro em 2009 na Universidade de Lisboa, em Portugal e o segundo em 2013 na Universidade de Nanterre – Paris X, na França. Tenho me dedicado à pesquisas e à orientação de trabalhos acadêmicos no campo da Cultura Popular, Identidade e Diversidade Cultural, Arte-Educação e temáticas afins. Coordeno atualmente o grupo de pesquisa GRIÔ: Culturas Populares, Diásporas Africanas e Educação, na Faculdade de Educação da UFBA 2- Como foi o seu primeiro contato com a capoeira? Comecei a me interessar pela capoeira ainda em São Paulo no final da década de 1980, quando conheci o Mestre Kenura, baiano radicado há um bom tempo em terras paulistanas. Quando me mudei para Salvador, logo conheci a capoeira angola do mestre João Pequeno de Pastinha, no Forte Santo Antonio. Foi paixão à primeira vista e desde então continuo fazendo parte da academia do mestre, mesmo após a sua morte no ano de 2011.
3- O senhor é formado pelo mestre João Pequeno de Pastinha. Como e quando o senhor o conheceu? Muitas impressões ficaram? Como disse, tive a honra de conhecê-lo em 1995, logo após minha chegada em Salvador, levado pelo meu amigo e também professor e pesquisador da capoeira, Vítor Castro Jr. Foi realmente muito impactante conhecer aquele homem, na época com 78 anos de idade, em pleno vigor físico, ainda ensinando e jogando a capoeira angola que aprendeu com seu mestre – Pastinha, símbolo maior dessa arte luta. João Pequeno foi o aluno mais importante do mestre Pastinha, a quem ele deixou o seu legado. João viajou por todo o Brasil e pelo mundo inteiro levando a capoeira angola com toda a generosidade e simplicidade, que eram suas marcas registradas. Até o fim de sua vida, foi considerado o mais importante capoeirista em atividade e até os 93 anos de idade, quando faleceu, ainda continuava jogando capoeira e ensinando aos mais jovens os caminhos sinuosos dessa tradição. No ano de 2008, tive a iniciativa de propor à UFBA, a outorga do título de “Doutor Honoris Causa” ao mestre João Pequeno, “analfabeto”, que recebeu as homenagens na Reitoria, com todas as honras que lhe eram de direito.
"(Mestre João Pequeno de Pastinha) até os 93 anos de idade, quando faleceu, ainda continuava jogando capoeira e ensinando aos mais jovens os caminhos sinuosos dessa tradição"
4- No livro Mestres e Capoeiras Famosos ”da Bahia, que chegou a sua 2ª edição em 2013, o senhor conta histórias e casos da capoeira da Bahia, além de traçar os perfis de diversas personalidades da nossa capoeira. Como foi o processo de reunião das informações que estão contidas nesta obra? A pesquisa sobre a capoeira é algo que alimenta minha trajetória de pesquisador já há muitos anos. Com base nisso, propus a criação de um grupo de pesquisadores, na época, bolsistas da UFBA, com o intuito de reunir informações sobre os mais importantes mestres de capoeira da Bahia, já falecidos, pois se fôssemos incluir os ainda vivos, não teríamos condições de cumprir essa tarefa. Eu coordenei essa pesquisa que teve apoio da Associação Forte da Capoeira e do Governo do Estado da Bahia, que durou três anos e que buscou informações nas mais variadas fontes: arquivos históricos, jornais da época, arquivos de registros policiais (pois a capoeira era considerada crime na época!), acervos de pesquisadores, filmes, fotografias, obras de arte, literatura, além de depoimentos orais de mestres antigos e pesquisadores da capoeira.
“A capoeira transforma a vida das pessoas! ”
5- Qual a relação que há entre a vivência do capoeirista dentro da roda de capoeira e na vida pessoal? A capoeira transforma a vida das pessoas! Afirmo isso por experiência própria, pois a minha vida foi transformada após o meu contato com a capoeira. A vivência na capoeira proporciona uma expansão e uma abertura para diversas dimensões do ser humano, que passa pela dimensão corporal, ao desafiar seus próprios limites, mas também por uma dimensão mais sensível, mais subjetiva, em que se aprende a valorizar a ancestralidade, a memória, a sabedoria dos mais antigos, a ritualidade e as formas de se relacionar com o sagrado, com o tempo, com a vida de uma forma geral, que vai muito além daquilo que a racionalidade moderna, e toda uma visão de mundo mercadológica e individualista tem nos imposto. 6- Deixe uma mensagem para os leitores da Edufba. Conheçam a capoeira...